Filosofia do Direito (Rechtsphilosophie): Ciência que pretende ordenar o saber na área de direito de acordo com sua Origem, Intento, Estrutura, Legitimação, Interdependência social e validade. A filosofia do direito limita-se a esboçar suas partes não como a história do direito, que se ocupa com o comportamento histórico inerente ao direito, ou como a sociologia do direito que investiga a relação do direito com a sociedade, a filosofia do direito considera tudo isso semelhantes formas fenomênicas e fontes distintas do direto. Além disto, busca-se conceituar as distintas avaliações das normas do direito e suas prescrições, com ênfase nestas últimas. A filosofia do direito é uma ciência, de acordo com isso, não apenas descritiva-teorética, mas também abstrata-prática. A filosofia do direito procura, com esse método, atacar a ponte entre a política concreta e prática do direito de um lado e sua dogmática de outro.
Colocação do Problema: O principal problema da filosofia do direito é o “Problema de Prova”, ou seja, como uma norma, uma pedra de toque em direitos, pode ser justificada. Há vários recursos para responder essa questão: de um mandamento de Deus (doutrina teológica), a doutrina do direito natural ou valor sobre-positivo e princípio (direito natural), a da razão humana (direito da razão), de acordo com o uso prático (utilitarismo), o interesse humano (Subjetivismo), acordo real ou fictício (Contratualismo), ou discurso racional condicionado (por exemplo, a teoria habermasiana do discurso).
Vertrag Lehre (doutrina do contrato): uma concepção, que tem sua origem no direito natural do esclarecimento, baseado na autonomia da categoria de indivíduo. Em antagonismo a “Filosofia do Estado” de Aristóteles que influenciara a escolástica medieval, que diz que o homem e seu entorno são criações determinadas pelo Estado. Invertendo a “Filosofia do Estado” o esclarecimento pensa o indivíduo como livre fenômeno em-si que, através de um contrato com todos os outros membros da sociedade transfere ao estado o domínio sobre si e através desse ato (fictício) legitima esse domínio. Essa doutrina do contrato manifestamente baseada no racionalismo cartesiano se daria em três passos: O estado de natureza, o contrato social concluído, e o estado social. (Parece haver respaldo no texto de Rousseau a primeira frase: no Capítulo VI do livro I lê-se: “Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja a pessoa e os bens de cada associado com toda a força comum, e pela qual cada um, unindo-se a todos, só obedece contudo a si mesmo, permanecendo assim tão livre quanto antes”. E Rousseau ainda acentua: “Esse, o problema fundamental cuja solução o contrato social oferece.”
Se considerarmos que a existência e a vida do corpo político já foram asseguradas, e então, que a vontade geral já estaria contida nesse corpo político, por que Rousseau dedica o cerne da discussão que busca definir as leis novamente à vontade geral? Já sabemos quão longe Rousseau está de Montesquieu, que, no Espírito das Leis, deriva as leis humanas da lei divina:
“Leis, em sua mais geral significação, são relações necessárias nascentes da natureza das coisas. Nesse sentido todos os seres têm suas leis: a divindade tem suas leis, o mundo material suas leis, as inteligências superiores aos homens suas leis, as bestas suas leis, os homens suas leis…Existe, então, uma razão primeira; e leis são relações subsistentes entre esta e as diferentes coisas, e as relações entre estas entre si.”
A lei para Rousseau está longe de expressar uma boa ordenação cósmica. Ao contrário, os homens, imersos num mundo confuso e com a possibilidade do erro a cada deliberação, necessitam de instituições positivas.
No parágrafo 5 Rousseau retoma a noção de vontade geral desenvolvida nos últimos capítulos para “provar” que esta nunca visa a objetos particulares. Explico. Um objeto particular está ou dentro ou fora de um estado. A vontade geral deve vir de todos e aplicar-se a todos, manifestamente então, a vontade geral não vem de qualquer coisa fora do estado. Se o objeto está dentro do estado encontraríamos este dividido, efetivamente, em duas facções: aqueles que possuem algum interesse particular em comum e os outros, com isso, em ambos, não haveria vontade geral.
Se o corpo político permanece uno, então todo o povo legisla algo para todo o povo de forma autônoma e a matéria a qual se legisla é geral como a vontade que a gera. A este ato, que pela vontade geral se alcança uma matéria geral, Rousseau dá o nome de lei. [Talvez o véu de ignorância de Rawls, como um procedimento de universalização, busque assegurar exatamente isso, ou seja, que a vontade geral contratante estabeleça a matéria a mais geral possível] Radicalizando a argumentação, na nota do penúltimo parágrafo Rousseau chega mesmo a dizer que a vontade geral é a lei. Entendamos, a vontade geral quando age sem coerção alcança às leis.
Rousseau dedica outro parágrafo para reafirmar que a vontade geral não visa objeto particular, só que a nova categoria lei será empregada. O objeto das leis é sempre geral, então não tratará de homens e ações particulares, e sim de um corpo uno e as ações como abstratas. A diferenciação da esfera de poderes Legislativo e Executivo é explícita no fim do parágrafo. Rousseau nos faz ver que o corpus legislativo engendra a estrutura normativa mais abstrata possível, que afetará as possibilidades dos particulares. Porém a lei em si não lida com a contingência das ações e dos indivíduos particulares. Para isso tem-se outra esfera do poder político, ou seja, o poder executivo que é admitido e assegurado como o exercício do mando sobre uma pessoa ou objeto, coisa que não pertence em nada à alçada das leis. A ação do poder executivo será então discricionária em relação apenas aos objetos particulares.
No próximo parágrafo Rousseau parece não ter dúvida nas respostas das quatro perguntas forjadas pelo seu próprio punho: I) a quem cabe fazer as leis? Sem duvida, ao legislador, matéria do próximo capítulo. II) o príncipe está acima das leis? não, pois de outra forma há de se admitir uma cisão do corpo político. III) a lei poderá ser injusta? também não, pois se um homem pertence ao corpo político uno, as leis positivadas estarão de acordo com sua vontade, o que garantirá a justiça das leis. IV) como se pode ser livre e estar sujeito às leis? A nota 5 da edição dos pensadores é a própria resposta: “É-se livre quando submetido às leis, porém não quando se obedece a um homem, porque nesse último caso obedeço à vontade de outrem, enquanto obedecendo à lei não obedeço senão à vontade pública que tanto é minha como de quem quer que seja” (Rousseau – Manuscrito de Neuchâtel)
No nono parágrafo, Rousseau afirma que república é todo o estado regido por leis e mais a frente que todo governo legítimo é republicano. Na nota explica que formas de governo aristocráticas ou democráticas entre outras, podem ser republicanas desde que sejam dirigidas pela lei, ou seja, pela vontade geral. Rousseau dedicará o Livro 3, entre outras coisas, a expor as diferentes formas de governo. O que me pareceu interessante do livro terceiro, numa leitura rápida, é que seguindo os princípios de 3.1 e 3.2 Rousseau diz que não há uma forma de governo melhor que as outras, mas que diferentes constituições se adaptam a diferentes pessoas e (3.3.8) que cada forma de governo “é a melhor em certos casos e a pior em outros”.
Numa brevíssima pesquisa [New Dictionary of the History of Ideas, Vol V] acerca do republicanismo, vê-se que o termo refere-se geralmente a qualquer regime político no qual nem o rei, nem uma dinastia hereditária governam os sujeitos num estado de submissão ou servidão. Historicamente, a linguagem do republicanismo é reconhecida como um dos discursos políticos centrais do ocidente. A questão talvez mais debatida pelos teóricos, hoje em dia, é a relação entre o republicanismo antigo e clássico, o medieval e o moderno. Cicero (106-43 a.C) foi o grande teórico sobre a questão na antiguidade. A questão chega ao período medieval e talvez a obra mais importante sobre o tema seja o Defensor Pacis (1324) escrita por Marsilius de Pádua (1280-1343).
O Renascimento Italiano é quase sempre visto como o momento áureo do pensamento republicano. Um dos temas centrais do Discurso sobre a primeira década de Tito Lívio, de Maquiavel, “é a defesa da tese que os elementos populares dentro de uma comunidade formam a melhor proteção da liberdade civil e igualmente a mais confiável fonte de deliberação a cerca do bem público.” Fora da Itália, a questão republicana é tratada também, na esteira de Maquiavel, por James Harrington (1611-1677) autor inglês que em seu livro principal The Commonwealth of Oceana (1656) critica agudamente a grande liberdade dos discursos públicos que levaram a ruína Atenas e Roma.
Finalmente, o republicanismo moderno assiste à entrada em cena de países como a Holanda, a França e os Estados Unidos. Uma importante mudança se dá com esta fase moderna: o estado territorial passa a ser, de fato, o cerne da atividade política, em contraposição à cidade. Além disso, a maioria dos teóricos modernos reconhece que o processo de debate político não se dá em uma relação direta entre os falantes e uma audiência. Entre os autores que buscaram na tradição republicana inspiração estão: Hannah Arendt, Alasdair MacIntyre e Michael Sandel.
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